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Jeeprofetas
outubro 7, 2008

Jeeprofetas, fé na estrada

Jipeiros de Congonhas organizam segunda edição da Expedição Jeeprofetas levando alegria, companheirismo e fé pela Estrada Real 

A Expedição Jeeprofetas da Estrada Real estava pronta para largar na cidade de Diamantina/MG. Era domingo, dia 13 de julho. Dia de sol e promessa de muita poeira e frio. Assim começava a minha primeira cobertura de uma expedição cheia de fortes emoções. Eu sequer imaginava o que estava por vir. 

Não se sabe nem porque nem de onde vem o desejo do homem de viajar, muito menos o fascínio que essas viagens causam. Só se sabe que ele existe e é mais forte que o medo do desconhecido. Assim como muitos jipeiros aqui, desde pequeno fui aficionado por Jeep Willys e de antemão imaginava que jamais iria ter a oportunidade de utilizar um Jeep nas mesmas condições que os valentes soldados dos filmes de guerra. De alguma forma agora o destino me trazia algo muito próximo ao sonho de criança. Estávamos ali nos preparando para 2ª Expedição Jeeprofetas. 32 homens, irmãos de sangue nas armas, em 12 Jeep veteranos de guerra com uma missão dada: carregar pelas trilhas da Estrada Real a carga histórica e cultural dos profetas de Congonhas. 

Jeeprofetas

Antes mesmo de saírmos de Diamantina um pensamento me veio à cabeça. Se eles não permitem nenhum jipe que não seja Willys na expedição, algum motivo deve haver que eu não saiba. E ali mesmo, antes da partida, um deles estragou. Nenhuma marcha entrava. Todos se reuniram em volta do carro e tomaram a decisão como numa companhia militar: “vamos consertar! Seja lá o que for, porque no Jeeprofetas ninguém fica para trás”. O motivo, além da paixão explícita que eles tinham pelo velho guerreiro, era o exercício de união, amizade e companheirismo em ajudar a cada Jeep, a cada quebra.  

Como dizem por aí, missão dada é missão cumprida. Após consertarmos o Jeep do Geraldo, começamos a executar o que seria nossa rotina. Todos de mãos dadas, rezamos um Pai Nosso e uma Ave Maria, entregamos um troféu à prefeitura, com homenagens enfatizando e parabenizando o fortalecimento de nossas culturas e divulgação de nossas riquezas. E eu, que sou corneteiro, ingressei em tocar a marcha batida e a coisa começou a ficar emocionante. 

Escoltados pelo Jeep Clube Diamantina, seguimos por estrada de terra até Curralinho, passando pela Gruta do Salitre, onde escravos fugitivos se refugiaram na época da escravidão. Curralinho até hoje tem garimpeiros locais que fazem extração manual de diamantes. É um lugarejo extremamente simples e bonito. Muita poeira, calor e a expedição seguia se comunicando pelo rádio de forma bem-organizada, avisando dos perigos da estrada. Nesse contexto passamos por Vau, um lugarejo muito simples onde avistamos a primeira manifestação de religiosidade que nos acompanharia por todo o trajeto, uma Procissão de Bom Jesus. Encostamos os jipes em sinal de respeito para dar passagem e seguimos para São Gonçalo do Rio das Pedras, onde os jipeiros de Diamantina se despediram de nós. Seguíamos agora por conta e risco. 

Jeeprofetas

Quando a poeira permitia, eu observava a formação geológica da região, que a milhões de anos atrás era fundo de oceano. As montanhas são feitas de pedras chanfradas, de cores lindíssimas, e impressiona a disposição delas, parecendo que foram colocadas uma a uma. Atravessando as montanhas seguimos até Milho Verde, uma localidade onde o turismo “artesanal” ou “natureba” havia se instalado de vez. Tudo visando a simplicidade e sua beleza, um lugarzinho mágico. Almoçamos e seguimos para a Cachoeira do Moinho. Após uma pausa para digestão, seguimos em direção a cidade do Serro, onde o queijo é tradição. Foi maravilhoso chegar numa cidade de construções históricas, sermos recebidos num prédio histórico e com um banquete regional: café cheiroso, queijo, pão de queijo e broa de queijo. Abri meu pão de queijo e coloquei queijo dentro. Só o mineiro sabe o que significa essa iguaria. Cruzamos na cidade pelos “Caminhantes de Congonhas” que estavam fazendo o mesmo trajeto a pé, ouvimos suas histórias, contamos as nossas e pousamos naquela cidade linda.

 

Loja Planeta Off-Road

 

Desde o primeiro dia fomos acordados pelo ‘Sensei’, um jipeiro lutador de karate que as seis horas da manhã fazia seus katas chutando as nossas portas para um despertar tranquilo e suave. Pois bem, muito frio nessa região que já é de mata atlântica, ajuda aqui e ali e todos os 4×4 funcionaram. Oração, homenagem ao Hotel da Tuca e pé na estrada. O nosso contingente tinha corneteiro, bombeiro, paramédico, cozinheiro e o mais importante, um mecânico especializado em Jeep. Para não quebrar a rotina de consertos, um dos jipes parou na estrada com vazamento de água. O parafuso que segura a polia soltou e toda água desceu. Retiramos um parafuso de outra parte do Jeep e substituímos. Mas e a água? Precisávamos de sete litros e só tínhamos três. Foi quando os jipeiros reunidos estavam queimando fosfato para achar água e um deles gritou: “gente, nóis é burro demais! Os krozebeques, esquecemos dos krozebeques”. Eu não entendi nada até que eles correram em seus jipes e voltaram com mochilas térmicas de armazenar água com o nome de “camel back”. Em nome da união cederam a própria água de beber para que um companheiro não ficasse para trás. Mais uma lição de companheirismo e seguimos viagem. 

Jeeprofetas

Num lugarejo chamado Alvorada de Minas cruzamos por uma garotinha de cinco anos com dois pés de boi nos braços, provavelmente para fazer caldo de mocotó. Cenas que só se vê na roça brava. Em Itapanhoacanga, uma tristeza e uma alegria: tristeza porque as obras de asfalto para Estrada Real já estavam a pleno vapor e talvez fosse a última expedição de terra naquele trecho. Alegria porque um caminhão pipa da obra lavou jipes e jipeiros, molhando tudo e todos. Dalí fomos almoçar num lugarzinho chamado Tapera, comida simples e sem igual de bem-feita. Conserta Jeep aqui, conserta ali, e a Mitsubishi L200 da organização não suportou andar a 30 km/h e ferveu. Pausa para esfriar e completar a água. Chegamos a Conceição do Mato Dentro recebidos no mercado central com apresentação de “congado marujada”, jantamos e fomos dar descanso ao corpo pois a coisa estava começando a ficar pesada no cansaço. 

Saímos pontualmente as nove da manhã após nossa rotina de orações e homenagens, além de uma entrevista na rádio. Fomos com destino a Itambé do Mato Dentro onde pousaríamos no final do dia. Durante todo o percurso éramos orientados pelos marcos da Estrada Real, e aprendemos a interpretá-los. Em nosso cronograma tínhamos uma surpresa muito interessante, uma visita a um senhor de 75 anos que, quando jovem e após uma desilusão amorosa, foi morar solitário numa caverna como um eremita. Muito interessante e imperdível para quem faz o trajeto. Chegamos a Itambé do Mato Dentro e fomos dormir pois o frio, a poeira e o cansaço estavam consumindo a todos. 

Jeeprofetas

Logo pela manhã uma surpresa: estavam nos esperando na porta do hotel os “Tropeiros de Nova Era” que fazem o caminho a cavalo, ouvimos histórias e causos, contamos também, homenagens e orações como de costume, faz um Jeep pegar aqui, outro Jeep com frio ali, enfim seguimos viagem. Poeira constante, subidas onde 4×2 não se aventuram e chegamos a Ipoema. Se até agora vínhamos na alusão a vida de soldados combatentes em seus jipes de guerra, tudo estava por mudar. Fomos muitíssimos bem recebidos no Museu do Tropeiro, por uma guia cultural que se emocionou ao ver o quão jipeiros são parecidos com tropeiros. Como ela disse, jipeiros são tropeiros da atualidade. Seguimos assim, como os tropeiros que carregavam a manta de carne sobre o arreio do cavalo para conservá-la, nós trazíamos a três dias alguns quilos de carne para churrasco e fomos fazê-lo nas Thermas do Rei, em Ipoema. Passamos uma tarde agradável, comendo e descansando, rindo, conversando e tocando modas de viola. Em Bom Jesus do Amparo onde só estaríamos de passagem, o prefeito nos cercou e tivemos que cumprir a rotina, toca corneta, lê texto, homenagens, tudo muito gostoso e agradável. Seguimos para Cocais onde, já escuro da tarde prematura de inverno fizemos, homenagens com a plateia da escola local que parou a aula e desceu para assistir.  

Acordamos sob um frio danado. Agora ninguém mais esmurrava a porta pela manhã, o karateca despertador foi acometido por um desarranjo intestinal. Abastecemos nossos jipes e partimos. Furo no radiador de um dos 12 guerreiros, o mecânico abre a maleta e tira uma massa de tomate, coloca no radiador, completa a água e seguimos viagem como se aquilo fosse normal. Passamos por Catas Altas, com sua serra maravilhosa ao fundo. Impressionante a beleza assim como a riqueza em minério que tem sido fruto de disputa entre a população local e as mineradoras. 

Jeeprofetas

A partir daqui entramos na parte mais religiosa da expedição. Depois de cruzar uma mata fechada maravilhosa com verdadeiras trilhas, chegamos ao Santuário do Caraça, colégio interno de renome no passado. Agora é hotel e oásis de paz, introspecção católica e contemplação da natureza. Imperdível! O contexto inclui um microclima que se compara ao sul do país na temperatura, a comida é coisa indescritível e a noite tem um show à parte: o lobo guará vem comer na nossa frente. Uma missa personalizada para os Jeeprofetas, muito emocionante, sentimos como se estivéssemos sendo recebidos na casa de um pai. Acordamos sob o frio de dois graus negativos. Simplesmente congelou tudo, gelo nos vidros, nas capotas, onde caiu sereno congelou. Para fazer os jipes funcionarem foi uma trabalheira. Deixamos para trás o lobo guará e fomos em sentido a Mariana, mas não sem antes passar em Santa Bárbara, onde a prefeitura estava começando um trabalho de recapeamento das ruas e praças e por conta disso chegamos no centro passando só por terra. Oportunamente fizemos a gracinha de agradecer a cidade a melhor acolhida de todas, pois arrancaram o asfalto para receber os jipeiros, era o nosso tapete vermelho. Praticamente fizemos trilha até Mariana devido às condições da estrada real. 

Acordamos sob um frio mais tranquilo de suportar, oramos e seguimos. Se no Caraça havíamos nos sentido na casa do pai agora estávamos indo em sentido à casa da mãe, para nossa última estadia antes da chegada em Congonhas. Passamos por Ouro Preto onde infelizmente esqueceram de nos receber. Seguimos para Cachoeira do Campo e chegamos no Retiro das Rosas das Irmãs, um colégio interno feminino que havia seguido os passos do Caraça e se transformado num hotel com as mesmas características. Logo na porta recebemos a benção da irmã Rosita, uma alma boa que abraçou os jipeiros um a um, sujos de terra, como uma mãe cuja saudade do filho supera em tamanho qualquer insalubridade que com ele tenha vindo. Ali na porta fizemos uma oração, tocamos a corneta e entramos para conhecer os quartos onde dormiríamos. Os organizadores haviam preparado uma surpresa: todos dormiriam no mesmo quarto! Isso mesmo, um alojamento para todos esses soldados, tropeiros, profetas, cristãos e irmãos. Ali simbolicamente estávamos recebendo um diploma de união, uma prova da conclusão de um curso de amizade, sentíamos como numa formatura. Todos no alojamento foi uma grande diversão, pois é claro que foi impossível dormir, risos, brincadeira com quem já havia dormido, violão, até um expedicionário vestiu peruca e baby doll as quatro da manhã e foi acordar os outros com beijinhos. Tínhamos tido uma missa especial antes de dormir e de manhã tivemos os Jeeps abençoados antes de seguir viagem com destino a Congonhas. 

Jeeprofetas

Depois de tanta emoção e aprendizado durante a expedição a maior prova de união estava por vir, um de nossos jipes foi abalroado por um caminhão na contramão e bateu lateralmente. Motorista e zequinha se machucaram. Todo o sentido de companheirismo, união e irmandade se manifestou ali, naquela hora. Socorremos os dois expedicionários machucados e seguimos nossa viagem para Congonhas do Campo, onde fomos recebidos e homenageados na Romaria, um local histórico e acolhedor para finalizar a expedição 2008. 

Para fechar com chave de ouro, na semana seguinte uma missa foi celebrada em Congonhas com a presença dos Jeeprofetas. Realmente foi uma experiência fenomenal e a missão estava cumprida em todos os quesitos com honras ao mérito. 

Agora é torcer para que o Jeeprofetas 2009 se transforme em passeio aberto, para que os leitores possam participar e sentir todas as emoções de uma expedição sem igual. 

por: Fernando Coelho

 

 

 

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